Por Natalia Demarco Kielek. Acadêmica de Medicina da URI Campus de Erechim. Bolsista de extensão – FURI e membro do Grupo de Pesquisa e Extensão PAHMIS.
Em 1891, um corajoso e visionário banqueiro judeu decide, em um ato de empatia, pela criação de uma companhia colonizadora, a Jewish Colonization Association (ICA), com o intuito de promover a emigração judaica do leste europeu. Barão Maurice de Hirsch inicia a compra de terras na América do Sul, na Argentina e, posteriormente, seus descendentes expandem sua política ao Rio Grande do Sul, inicialmente em terrenos próximos à Santa Maria e, em 1909, em uma região denominada Fazenda Quatro Irmãos.
A relação judaica com a medicina tem sua proximidade com a origem da religião, sobretudo na construção dos mandamentos judaicos. O mandamento da cura dos doentes pode violar outros 610 mandamentos judaicos, sendo apenas três outros invioláveis: adultério, idolatria e assassinato. Além disso, um terço dos mandamentos da Torá versam sobre regras de saúde. É evidente, portanto, a estreita influência e importância do cuidado à saúde ao judaísmo.

O Hospital – Imagem contempoânea

Divulgação

O Hospital em construção – Acervo

Enfermeira e Parteira Francisca Mermelstein – Acervo
Logo, não são diferentes as preocupações e os cuidados com a saúde na nova Colônia Quatro Irmãos. Em princípio, os primeiros colonos já contavam com um médico que atendia à localidade. Com o passar dos anos, diversos médicos atuaram na Colônia, e doentes de maior gravidade eram encaminhados a hospitais da região, como Passo Fundo, Erebango ou Getúlio Vargas.
Entretanto, no fim da década de 1920, a população, organizada nos núcleos de colonização, reclama por um hospital adequado em Quatro Irmãos aos diretores da ICA. A reivindicação, contudo, foi atendida somente em 1931, com a pressão imposta por Dr. Sirkes para a construção de um hospital na Colônia. Em 1932, o hospital é construído, com a ajuda de colonos da região: Moyses e Isaías Viunitzky, Gregório e M. Prikladnitzky e Jayme Rachtalor. A madeira para a construção foi providenciada pela ICA, advinda dos pinheiros da região.
Em 1933, o Hospital Leonardo Cohen é inaugurado, recebendo essa nomeação por conta do então diretor da colonizadora, Leonardo Cohen. Divulgado como hospital modelo, a instituição foi construída conforme a arquitetura hospitalar da Inglaterra da época, seguindo preceitos sanitários e de higiene, até então não vistos nas instituições do entorno.
O hospital possuía uma área molhada, projetada para a sala de cirurgia e de parto, uma em frente à outra. Também, comportava espaço para consultório médico, farmácia, laboratório e gabinete dentário. Equipamentos e instrumentos cirúrgicos como tesouras, pinças e bisturis, além de materiais hospitalares diversos como espéculos, válvula de Doyen e até mesmo máquinas médicas revolucionárias como o pulmão de aço estiveram disponíveis na instituição.
Entre os diversos médicos e diretores que trabalharam na instituição, o Dr. Otto Goldberg frequentemente é lembrado pelos descendentes da Colônia como um médico amoroso, além de hábil. Dr. Otto foi o médico que permaneceu por mais tempo frente às questões de saúde na Colônia, sendo responsável pela realização de nascimentos, operações e ensinamentos que ainda perduram entre os colonos.
Em 1962, contudo, a ICA encerra suas atividades na Colônia Quatro Irmãos, transferindo sua sede para Erechim. Como consequência, o hospital também encerra, definitivamente, seu funcionamento, sendo que os últimos registros de alguma atividade da
instituição datam de abril de 1961, com a presença do possível último médico a atuar no hospital, Alberto Monti.
O hospital Leonardo Cohen foi o primeiro hospital israelita do Brasil, sendo sua história um símbolo de resistência ao povo judaico que imigrou para o norte do estado gaúcho. O resgate da sua história permite reconstruir a memória e a importância dessa instituição aos colonos de Quatro Irmãos.